23.6.11

A compra (1)




A importância da cor, nesta compra, posso explicar em dois tempos: ou preta ou verde escura. São estas as duas únicas hipóteses para a tinta que há-de pintar o quadro da minha futura bicicleta. O quadro terá de ser adulto, adulto no sentido de clássico, um que me permita pedalar, sem parecer deslocado do quadro, quadro aqui enquanto tela e enquanto esqueleto da bicicleta, esteja eu metido na compostura de um fato, na casualidade de uns jeans ou na descontração total de uns calções. É com esta lógica de conjugação que chegamos aos pedais. Os pedais não podem fugir ao padrão de critério anterior e deverão calçar com o mesmo à vontade a borracha dos chinelos, a pele dos sapatos e a lona das sapatilhas. Do selim não se espera um sofá, apenas se exige conforto. De resto, a buzina que apita, o guiador que guie e as mudanças que mudem. E claro, que os travões travem

15.6.11

Crónica das nuvens que passam

Um homem aproxima-se do areal calçado com dois chinelos de dedo azuis, carrega num dos ombros um pára-vento azul enrolado, só as pontas de madeira saem fora do tecido, vem com uma mochila cinzenta nas costas, veste uma t-shirt cinzenta, as letras brancas escrevem uma palavra no peito, para baixo, na cintura, tem uns calçōes azuis em tecido fino, por baixo dos quais traz uns calções pretos em licra, mais curtos, para apanhar sol na maior superfície possível do corpo. Antes de chegar e de pousar no chão a toalha vermelha, antes de tirar a t-shirt, os calções e os chinelos de dedo, este homem, este rosto barbado, protegido da luz do dia por duas lentes de vidro verde escuro e aros dourados, este homem tem a cor do céu e das nuvens que passam.

Bob Dylan

Aquele bendito instrumento musical, a máquina de escrever, e os seus botões de onanizar tímpanos, as teclas, corpos fora do corpo,...